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Alexandra Cardona Restrepo: escrita e luta pelos direitos dos autores da Colômbia

  • CreatorsNews
  • há 5 horas
  • 4 min de leitura
Alexandra Cardona Restrepo é roteirista, professora, dramaturga e atual presidenta da REDES, a Rede Colombiana de Escritores Audiovisuais. A partir desse espaço, tem sido uma figura central na conquista de direitos para autoras e autores audiovisuais em seu país. Por Ulises Rodriguez

“Ser roteirista é um trabalho essencialmente coletivo. Embora a gente escreva sozinho, as histórias não ganham vida sem o diálogo com os outros. Talvez por isso, há algum tempo eu sentia que meu lugar também estava na construção de uma comunidade entre autores”, conta Alexandra Cardona Restrepo à AV Creators News.


Ela é reconhecida por uma trajetória comprometida com os direitos humanos e a memória histórica do país. Desde sua produtora Karamelo Producciones Ltda, abordou com profundidade temas sensíveis do conflito colombiano em documentários como Escuela y desplazamiento (2002), ¡La vida Vive! (2007), Los derechos humanos, el punto de entrada: El Corazón (2004) e Tiempo de la verdad (2007), este último difundido por todos os canais da TV pública e centrado nas vítimas da Lei de Justiça e Paz.



Seu longa-metragem documental Retratos de familia (2010–2013), centrado no drama dos mal chamados “falsos positivos” e na luta das Mães de Soacha, teve impacto nacional e internacional. Também dirigiu peças sobre processos de reconciliação em comunidades rurais e populares com a Fundación Nacional Batuta, e cocriou o programa de televisão Las Kosas por su nombre, em que a crítica aos meios de comunicação é feita com humor. Confesión a Laura (1992), sua obra documental, consolidou-se como uma das vozes mais firmes do cinema colombiano contemporâneo.

Esse caminho criativo encontrou um novo rumo com a criação da REDES, em 2013 — um espaço surgido diante da necessidade urgente de representação para roteiristas e diretores, historicamente excluídos dos direitos pela comunicação pública de suas obras.


A Lei Pepe Sánchez: uma conquista histórica “Naquele momento, nos organizamos para defender algo muito básico: que fôssemos reconhecidos como autores. Parecia óbvio, mas não era. Na prática, não tínhamos direito a uma remuneração pela exibição ou transmissão das nossas obras”, lembra Cardona Restrepo.


A luta tomou forma jurídica e política no que hoje é conhecido como a Lei Pepe Sánchez (Lei 1835 de 2017), uma norma que representou um ponto de inflexão para a autoria audiovisual na Colômbia. Sua aprovação não foi imediata: exigiu debates legislativos, mobilização de classe, alianças com sociedades de gestão coletiva e, acima de tudo, uma convicção sustentada.



“Participar ativamente desse processo foi um dos momentos mais transformadores da minha vida profissional. Foi uma lição de cidadania: entendemos que os direitos se conquistam com ação organizada, e não esperando que a indústria os reconheça por vontade própria”, afirma.


REDES: uma organização que reúne e potencializa A REDES, formada por autoras e autores de todas as gerações e regiões da Colômbia, foi fundamental para instalar o debate na mídia, dar visibilidade ao papel do roteirista e alcançar consensos que antes pareciam impossíveis. “O poder de uma organização como a REDES é que ela agrupa a diversidade. Há escritores de séries, de longas, de curtas, de televisão pública e privada, do Caribe e dos Andes. Essa pluralidade nos deu legitimidade para reivindicar uma lei que era de todos”, explica sua presidenta.


Desde a implementação da lei e o início da cobrança por comunicação pública das obras — gerida pela sociedade DASC (Directores Audiovisuales Sociedad Colombiana) —, a transformação tem sido concreta. “Não se trata apenas da renda, que em muitos casos representa uma ajuda vital. Também se trata de uma mudança simbólica: já não somos invisíveis. Hoje, quem escreve tem um lugar na cadeia de valor do audiovisual”, destaca Cardona Restrepo.


Mas o trabalho não terminou com a sanção da lei. A REDES tem impulsionado novas pautas: programas de formação, participação internacional, defesa dos direitos trabalhistas dos roteiristas, debates éticos sobre a inteligência artificial e ações para dar visibilidade às mulheres autoras num meio ainda marcado por desigualdades de gênero.

Conselho Diretor da REDES
Conselho Diretor da REDES
I.A.: entre a ameaça e o debate urgente

Um dos temas que mais mobilizam hoje a organização é justamente o impacto da inteligência artificial generativa no ofício. “Estamos diante de um desafio gigantesco. A IA levanta questões profundas sobre autoria, originalidade, valor do trabalho criativo. Na REDES, abrimos espaços de discussão sobre esses temas porque acreditamos que não se pode legislar nem negociar o que não se compreende a fundo”, afirma.


Segundo a roteirista, é fundamental que os Estados e as plataformas tecnológicas reconheçam que as ferramentas automatizadas não substituem a experiência humana de narrar, e que toda implementação deve ser feita com proteção aos direitos autorais.


Quanto ao panorama geral do setor, Cardona Restrepo reconhece avanços, mas também persistências preocupantes. “Há uma oferta crescente de conteúdos, mas muitas vezes as condições de trabalho são precárias. É necessário estabelecer mínimos éticos para a contratação, garantir tempo real de escrita e fomentar a diversidade de vozes. Não pode ser que a gente escreva histórias para milhões e não consiga pagar o aluguel”, diz com firmeza.


A presidenta da REDES considera que fortalecer o papel do autor na indústria não é apenas uma reivindicação trabalhista, mas uma aposta na qualidade do conteúdo. “Quando o roteirista tem condições dignas, tempo de desenvolvimento e um lugar nas decisões criativas, as histórias se enriquecem. O público também se beneficia. É um círculo virtuoso.”

Conselho Diretor da REDES e equipe técnica
Conselho Diretor da REDES e equipe técnica
Redes internacionais: construir força a partir da América Latina

 Além de seu trabalho na Colômbia, Alexandra Cardona Restrepo participa ativamente de organizações internacionais como a AVACI (Confederação Internacional de Autores Audiovisuais) e a FESAAL (Federação de Sociedades de Autores Audiovisuais da América Latina), espaços que têm sido fundamentais para conectar as lutas locais com processos globais. “Esses fóruns nos permitem aprender com outras experiências, compartilhar ferramentas e exercer pressão em bloco diante das plataformas e dos legisladores. Na América Latina, precisamos de alianças transnacionais porque muitos dos nossos problemas são comuns”, afirma.



Olhando para o futuro, Cardona Restrepo insiste na necessidade de fortalecer o tecido associativo: “Nada do que foi conquistado teria sido possível sem organização coletiva. Hoje, os mais jovens escrevem sabendo que existe um espaço que os respalda, que não estão sozinhos.”


A quem está começando a escrever roteiros na Colômbia, deixa uma mensagem clara: “Este é um ofício lindo, mas também muito exigente. Não se deixem seduzir pela ideia do gênio solitário. As melhores histórias são escritas em comunidade. E essa comunidade, para nós, se chama REDES".



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